14/12/10

questão de anamorfose

Encontrei um texto interessante sobre a anamrofose nos romances de António Lobo Antunes e queria partilhá-lo com vocês.

“A expressão da anamorfose – como forma modificada da escrita ou como reescrita textual da matéria narrada – pode ser configurada como um procedimento estético que permeia algumas narrativas de António Lobo Antunes. ALA obriga o leitor a
deslocar-se no texto diante de suas múltiplas histórias, as suas e as dos outros. Esse processo criativo pode ser compreendido como uma perspectiva em anamorfose. Severo Sarduy esclarece:

“Dilatação de um contorno e duplicação do centro: ou antes, deslizar programado do ponto
de vista, desde a posição frontal até esse ponto máximo de lateralidade que permite a
constituição de uma outra figura regular: anamorfose. (SARDUY, 1988:65)
Embora António Lobo Antunes exponha, em seu processo singular de criação, toda a construção do tecido literário, parece buscar de modo obsessivo o “regresso a si mesmo” (SARDUY, 1988:54), isto é, a revisão de seus procedimentos de escrita,
demonstrando simultaneamente uma preocupação com a descoberta do outro, que se mostra ou é visto em imagem distorcida ou anamórfica.
Em outro ensaio de Severo Sarduy, intitulado “La simulación”, o autor assegura
que a anamorfose é o discurso do espectador, pois neste caso há algo na obra de arte que lhe é ocultado, impelindo aquele que a aprecia a participar de sua feitura. A anamorfose é uma rubrica das artes plásticas e representa uma figura, um objeto ou uma cena de maneira que, quando contemplada frontalmente, torna-se distorcida e até mesmo irreconhecível, aparecendo com nitidez somente quando vista de um determinado ângulo, a certa distância, ou ainda com o uso de lentes especiais, ou com a ajuda de um espelho curvo. Para Sarduy,
A anamorfose e o discurso do espectador como forma de ocultação: algo que se oculta ao
sujeito – e daí o seu mal estar – e não pode ser lido, revela mais que uma mudança de lugar.
O sujeito está implicado na leitura do espetáculo, na tradução do discurso, precisamente
porque isso que de imediato não consegue ver ou ouvir o transforma diretamente no sujeito.
O inquietante é que a relação frontal do sujeito ao espetáculo não possa ser considerado
como algo adquirido com a certeza de uma premissa. (SARDUY, 1999: 1276-77)

Desse modo, cabe ao leitor deslocar-se no texto porque precisa constantemente
retomar vários aspectos da narrativa, juntar os relatos a partir de memórias
fragmentadas, e situando-se em tempos e espaços que se superpõem ao longo de todo o romance. Esse modo não habitual de tratar a palavra pode ser compreendido neste estudo a partir da etimologia da palavra “anamorfose”, pois “morfose” significa a aquisição de uma forma, enquanto anamorfose, quer dizer “formado de novo”. Portanto, todo o processo de criação do autor culmina em metamorfose, pois esta implica a mudança completa da forma. Logo, as vozes que pertencem a essas personagens cujos “vagos rostos” são informes, fazem parte de uma narrativa marcada por uma perspectiva em anamorfose, cuja escrita indefinida se mantém em um processo contínuo de mudança, desdobrando-se em metamorfose.”


Fragmento do texto “A ANAMORFOSE NA ESCRITURA DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES” de
Maria Cristina Chaves de Carvalho (Doutoranda em Literatura Comparada da Universidade Federal Fluminense (UFF).)

2 comentários:

  1. E qual é o teu comentário ao excerto crítico apresentado? Encontrar informação é o primeiro passo, mas agora faltam os outros - a tua reflexão crítica, as tuas ideias, a tua contribuição para completar a análise que te foi pedida em aula.

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  2. o conceito da metamorfose é muito adequado a situação do narrador porque ele ao longo do romance está sujito as condições que o mudam, mas acho que ele muda de borboleta para a larva. Ele é uma larva ao voltar a Lisboa não se sabe bem em que se transformará.

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